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Nutrição

Queres Mais Energia Para Correr? | Os Alimentos E Suplementos Certos

Queres Mais Energia Para Correr? | Os Alimentos E Suplementos Certos
Tatiana Fernandes Coelho
Escritor1 ano Atrás
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Embora os especialistas em nutrição desportiva acreditem que as necessidades individuais de proteína, como potenciadora da performance física e dos ganhos musculares, são genericamente superiores ao que se julgava no passado, em particular para os atletas de treino de força e de resistência, e que a gordura presente nos alimentos pode assegurar um bom desempenho nos treinos de baixa intensidade, alguns estudos recentes apontam para os hidratos de carbono como indispensáveis enquanto fonte de energia para os treinos de alta intensidade e de longa duração.

Na prática, os hidratos de carbono estão para os atletas de resistência (endurance) como a proteína está para os praticantes de treino de força e de musculação. De facto, os hidratos de carbono são essenciais para garantir uma potenciar a performance física e o rendimento, em treinos de condicionamento cardiovascular e de endurance. Neste artigo vamos falar um pouco mais sobre a importância da ingestão de hidratos de carbono, em especial para os atletas de endurance e adeptos de corrida.

O que são exatamente os hidratos de carbono e onde os podemos encontrar?

Os hidratos de carbono incluem o grupo dos macronutrientes, juntamente com a proteína e a gordura, por serem indispensáveis a um organismo saudável e funcional. Os hidratos de carbono, presentes nos alimentos sob a forma de fibras alimentares, amidos e açúcares, são nutrientes essenciais que o organismo humano consegue transformar em glicose, para produção da energia indispensável a todos os processos fisiológicos.

A estrutura química dos hidratos de carbono e a rapidez com que o organismo os digere e absorve determinam se um alimento contém hidratos de carbono simples ou complexos. Os hidratos de carbono complexos, naturalmente presentes na fruta, nos vegetais, nos legumes e nos cereais integrais, por serem mais difíceis de digerir, não aumentam os níveis de glicose no sangue de forma brusca, ou seja, não induzem picos de glicémia - por esta razão, são também designados por hidratos de carbono de baixo índice glicémico. Já os hidratos de carbono simples, por serem rapidamente decompostos pelo sistema digestivo e absorvidos para a corrente sanguínea, induzem uma subida abrupta da glicose sanguínea e dos níveis de insulina - a hormona responsável pela entrada de glicose nas células. Estes hidratos de carbono têm, assim, um elevado índice glicémico e os picos de insulina que causam contribuem para o aumento da resistência celular à insulina, para o armazenamento da glicose excedente sob a forma de gordura no tecido adiposo, para o ganho de peso e para um risco acrescido de desenvolvimento patologias cardiovasculares e metabólicas.

Os amidos são um tipo de hidratos de carbono complexos, cuja estrutura química requer mais tempo de digestão para ser quebrada nas suas moléculas constituintes. Como resultado, os níveis de açúcar (glicose) no sangue permanecem mais estáveis, a produção de insulina é mais faseada e a sensação de saciedade dura mais tempo. Podemos encontrar hidratos de carbono amiláceos nas leguminosas, como o feijão, o grão e as lentilhas, na fruta, como a maçã, os frutos vermelho e a banana, nos cereais integrais, como o arroz, a aveia, o sorgo e o trigo, e em legumes como o milho, as ervilhas e as batatas. Os alimentos de origem vegetal, como a fruta, os legumes, os vegetais e os cereais integrais, contêm ainda hidratos de carbono complexos, sob a forma de fibras alimentares, que não estão presentes nos alimentos de origem animal.

As fibras são hidratos de carbono complexos que o sistema digestivo humano não consegue digerir ou só digere parcialmente, o que contribui para estimular o processo digestivo, diminuir a absorção dos hidratos de carbono simples e das gorduras dos alimentos, atrasar o esvaziamento gástrico, aumentar a sensação de saciedade e controlar a fome, reforçar a flora do intestino, regular o trânsito intestinal e estabilizar os níveis totais de glicose e de colesterol no sangue. Os especialistas em nutrição recomendam que um adulto saudável consuma entre 25 a 30 gramas de fibras por dia, mas a maioria da população ingere apenas metade desta quantidade. Alguns dos alimentos com maior teor de fibra incluem:

  • - Leguminosas: feijão preto, feijão vermelho, feijão-frade, grão-de-bico e lentilhas;
  • - Frutas com casca e sementes comestíveis: maçã, pêra, uva e pêssego;
  • - Frutos secos: amêndoas, amendoins, nozes e pistachos;
  • - Sementes: abóbora, girassol, linhaça e cânhamo;
  • - Cereais integrais, como o arroz, a aveia, a quinoa, os cereais e o pão e as massas integrais;
  • - Vegetais de folha verde e legumes: milho, brócolos, repolho, espinafres, couve-de-bruxelas, batata e abóbora.

Os açúcares simples, como a frutose (presente na fruta) e a lactose (presente nos laticínios), são um tipo de hidratos de carbono simples de elevado índice glicémico, que o organismo decompõe e absorve de forma muito rápida, aumentando abruptamente os níveis de açúcar no sangue e a produção de insulina. Estes picos glicémicos e insulínicos estimulam a entrada rápida de glicose nas células, para ser convertida em energia, fazendo com que a glicémia sanguínea baixe pouco tempo depois. Esta alternância brusca de picos de energia resulta na sensação de cansaço e de fome. Para além disso, a subida demasiado rápida dos níveis de glicose no sangue induzem a acumulação da glicose excedente sob a forma de gordura no tecido adiposo. Existem dois tipos de açúcares simples:

  • - Açúcares naturais, como os encontrados no leite (lactose) e nas frutas frescas (frutose);
  • - Açúcares adicionados, como o açúcar refinado (sacarose) encontrado nos doces, nos chocolates, nas frutas enlatadas e nos refrigerantes.

Mas deves ter presente que estes hidratos de carbono simples sob a forma de açúcar podem ter muitos nomes e, nos rótulos dos alimentos processados, podem aparecer listado como: xarope de agave, xarope de cana, xarope de milho, dextrose, frutose, sacarose, mel, melaço, açúcar de cana, etc..

Quais os benefícios dos hidratos para os atletas de endurance?

Após serem digeridos, os hidratos de carbono são convertidos em moléculas de glicose, que não sendo utilizadas de imediato são armazenadas no fígado e nos músculos sob a forma de reservas de glicogénio, para serem posteriormente usadas como matéria-prima na produção da energia extra necessária durante o treino. Apesar da gordura e da proteína também poderem ser usadas para produzir energia, os hidratos de carbono são sempre a fonte preferencial de energia para o cérebro e para os músculos, e para a reposição das reservas de glicogénio no músculo esquelético. De facto, inúmeros estudos têm comprovado que os hidratos de carbono contribuem para melhorar o desempenho físico durante os treinos de endurance, retardando a fadiga, diminuindo a perceção do esforço e permitindo um rendimento ao mais alto nível durante mais tempo.

Um atleta de endurance treina, normalmente, a uma taxa de VO2max (volume de oxigénio máximo gasto durante a prática de exercício físico de elevada intensidade) que ronda os 75-90%. Sabendo que o glicogénio armazenado no fígado não ultrapassa os 100 gramas e que no músculo esquelético ronda os 300-500 gramas, no máximo, o nosso corpo dispõe de aproximadamente 1600 a 2400 calorias (4 calorias/grama) até esgotar todas as reservas de glicogénio. Isto significa que o glicogénio disponível para gerar energia se esgota após 90-120 minutos de treino cardiovascular a 65-75% do VO2max.

Uma vez que o treino de endurance é realizado no limiar do metabolismo aeróbico, na ausência de hidratos de carbono e de reservas de glicogénio, a oxidação das gorduras não consegue satisfazer atempadamente as necessidades energéticas dos músculos durante o exercício, o que resulta em fadiga, quebra do rendimento e até mesmo catabolismo muscular. É exatamente por esta razão que a ingestão de hidratos de carbono, como fonte primordial e imediata de energia, se torna tão imperativo para os atletas de resistência, sendo essencial para repor as reservas de glicogénio muscular, antes, durante e após o treino.

Que quantidade de hidratos de carbono deve ingerir um atleta de endurance?

A quantidade diária recomendada de hidratos de carbono para os treinos de endurance depende, obrigatoriamente, das características físicas de cada atleta, da intensidade e da duração das sessões de treino, e da regularidade com que é praticado. No entanto, a recomendação mais consensual é de cerca de 7 a 10 gramas de hidratos de carbono por quilo de peso corporal por dia, o que representa aproximadamente 60-70% da energia total diária disponível para o trabalho muscular. Para quem ainda não faz treinos de endurance muito longos, é mais adequado começar com cerca de 4 a 6 gramas de hidratos de carbono por quilo de peso corporal por dia.

Qual a melhor altura para ingerir hidratos de carbono?

  • Hidratos de Carbono Pré-Treino

O objetivo das refeições pré-treino é o de permitir manter os níveis suficientes de glicose no sangue e, assim, evitar o recurso às reservas de glicogénio hepáticas e musculares para a produção de energia durante o treino. O período pré-treino para a ingestão adequada de fontes de hidratos de carbono pode ser dividido em três blocos: dias, 2-4 horas e 60 minutos.

Alguns dias antes do treino ou da competição deves iniciar um período de carb load (carga de hidratos), que envolve fazeres uma fase de depleção total do glicogénio após o exercício intenso, seguida de uma fase de carga com a ingestão de 500 a 600 gramas de hidratos por dia, associada a um reduzido volume de treino. No dia do treino ou da competição, 2 a 4 horas antes, é recomendável a ingestão de 200 a 300 gramas de hidratos de carbono, caso não seja possível ingeri-los durante o treino. Mas, se treinas de manhã cedo, ingerir uma refeição 2 a 4 horas antes de treinar não é razoável. Assim, cerca de 60 minutos antes do teu treino, deves ingerires 30 a 60 gramas hidratos de carbono, provenientes de fontes alimentares de qualidade.

  • Hidratos de Carbono Intra-Treino

O objetivo do aporte de hidratos de carbono durante o treino, seja através do consumo de alimentos ricos em açúcares simples seja através do uso de suplementação adequada, é o mesmo das refeições pré-treino, ou seja, tem a finalidade de manter os níveis sanguíneos de glicose equilibrados, minimizar o uso das reservas de glicogénio musculares e evitar a sua depleção. Em treinos com duração superior a 90 minutos, deves considerar a ingestão de 30 a 60 gramas de hidratos de carbono por hora ao longo do treino. Se a tua sessão de treino durar mais de 3 horas, deves aumentar a dose para cerca de 60 a 90 gramas de hidratos de carbono por hora.

  • Hidratos de Carbono Pós-Treino

No final de qualquer sessão de endurance, deves garantir que o consumo de hidratos de carbono é suficiente para repor e reabastecer as reservas de glicogénio do fígado e dos músculos, no caso de terem sofrido depleção. Este aporte de hidratos de carbono é especialmente importante para evitar o catabolismo muscular e para acelerar os processos de regeneração e recuperação dos músculos após o treino. Por esta razão, é aconselhável que consumas entre 200 a 300 gramas de hidratos de carbono nas primeiras horas que se seguem ao término da sessão de treino.

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Quais os suplementos de hidratos de carbono mais adequados?

Os suplementos de hidratos de carbono são especialmente úteis para usar durante o treino, uma vez que são práticos de consumir e de rápida ação. Suplementos como batidos, géis energéticos e bebidas energéticas são os mais convenientes como intra-treino para repor glicogénio e eletrólitos. No entanto, existem suplementos com elevado teor de hidratos de carbono que são indicados para consumir como pré-treino, como é o caso da glucose, da dextrose, da dextrina cíclica e a maltodextrina, para melhorar a performance e o rendimento físicos e evitar a fadiga, ou como pós-treino, para reduzir a dor muscular e acelerar a regeneração e a recuperação dos músculos.

Mensagem Final

Embora a compreensão acerca das necessidades nutricionais dos atletas de endurance tenha aumentado substancialmente nos últimos anos e as ferramentas científicas, usadas para medir a forma como o corpo humano assimila e metabolizam os alimentos, se tenham tornado mais sofisticadas, os princípios básicos da nutrição desportiva não mudaram assim tão drasticamente nos últimos 25 anos.

Apesar de se reconhecer que as necessidades de proteína, de qualquer praticante regular de exercício físico de alta intensidade ou de treino de endurance, são mais elevadas do que se pensava anteriormente e que a escolha do horário e do conteúdo das refeições pré-, intra- e pós-treino pode afetar consideravelmente o rendimento físico e a recuperação muscular, um fator que permanece tão atual como há décadas é a necessidade incontornável dos atletas tornarem os hidratos de carbono num componente-chave da dieta, com o objetivo de reduzir ou mesmo evitar os efeitos adversos da depleção das reservas de glicogénio do fígado e dos músculos.

Apesar da proteína e da gordura também poderem ser usadas para a produção da energia necessária ao trabalho muscular e ao metabolismo aeróbico, os hidratos de carbono são o único macronutriente que pode ser decomposto com rapidez suficiente para fornecer energia imediata durante os treinos de resistência de longa duração e elevada intensidade.

Fontes:

NCBI https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5794245/

Cleveland Clinic https://my.clevelandclinic.org/health/articles/15416-carbohydrates

 

Tatiana é Doutorada em Ciências Médicas e da Saúde, pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, tendo, ao longo da sua carreira de investigação científica, sido autora de artigos académicos publicados em revistas internacionais, na área da Genética e da Biologia Molecular.

A sua experiência como Técnica Especialista em Exercício Físico e Coach L-1 de CrossFit, potencia a sua paixão por todas as vertentes da otimização da performance atlética na prática desportiva, tendo, inclusivamente, escrito alguns artigos de revisão sobre a influência do background genético na performance e resistência físicas, na adaptabilidade ao treino e na resposta fisiológica à nutrição e suplementação desportivas.

Mais informações sobre Tatiana Fernandes Coelho: LinkedIn, ORCID e PubMed.

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